“Sete palmos para quem quer terra” e a crônica interminável do direito de matar



A execução de dois líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Alhandra neste final de semana escreveu um capítulo novo em uma interminável crônica de sangue que se abate sobre a Paraíba de tempos em tempos e que mostrou que não cessará mesmo em tempos que parecem ser outros.

Os nomes de José Bernardo da Silva, conhecido como Orlando, e Rodrigo Celestino, riscados do mundo dos viventes dentro do acampamento Dom José Maria Pires, se juntam aos de João Pedro Teixeira, trucidado em Sapé, Margarida Maria Alves, exterminada em Alagoa Grande, Anastácio Abreu e Lima, tocaiado em Rio Tinto e tantos outros executados por quem, de tanta terra que possui, se julga dono até do céu e detentor do direito de dispor das vidas humanas.

Uma coisa é não apoiar o MST. Uma coisa é denunciar os excessos do movimento. Uma coisa é apontar a partidarização das ações dos sem-terra. Outra bem diferente é desconhecer que há, mesmo em meio a tudo isso, causas legítimas e pessoas lutando por estas causas. Outra ainda mais diferente é fechar os olhos para aquilo que Raymundo Asfóra bem denominou de “sindicado da morte”.

Evandro Barros escreveu o conto de terror “Sete palmos para quem quer terra”, uma novela que, em verdade, representa o horror realístico de um cotidiano histórico em que latifundiários reputam-se no direito de matar, de exercer o papel de proprietários da lei humana e divina, donos das vidas de gente que, aos seus olhos, não têm valor.

É preciso defender-se o Estado de direito na prática e tal só ocorre se esse Estado faz impor o direito para todos. A propriedade é um bem constitucionalmente protegido. Ponto! Mas, a sua função social também é desiderato claramente consignado na Carta Magna – e de maneira extremamente correta. Não se pode simplesmente abandonar a terra ao mato quando ela pode ser utilizada para produzir alimento, sustentar famílias, fazer girar a economia.

É preciso repudiar-se tanto o extremismo esquerdista que não respeita limites, que afronta direitos legítimos, bem como o radicalismo criminoso e cego que não admite a realidade social e seus conflitos inevitáveis. O remédio para eventuais esbulhos ilegais só pode ser a justiça, que precisa ser célere. O remédio para quem mata só pode ser a justiça, que precisa ser célere e implacável.

Que a barbárie de Alhandra não venha a se assemelhar a outros episódios que banharam de sangue o chão da Paraíba também quanto à impunidade. Pode haver divergências quanto à legitimidade da propriedade de terras, mas nunca sobre a total impossibilidade de se admitir que poderosos se julguem no direito a exercer sua própria lei. É tempo de se fazer justiça!

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