Na prática, ações contra eleitos em Campina propõem cassar 40 mil eleitores


Pelo menos duas ações de investigação judicial eleitoral (Aijes) foram propostas em Campina Grande por candidatos não eleitos apontando que três partidos teriam usado candidaturas “laranjas” para preencher a cota de gênero, o que deveria resultar, em síntese, na anulação de todos os votos atribuídos a estas siglas, com consequente recontagem dos votos.

As ações, direcionadas contra o Pros, DEM e SD, se baseiam em entendimento jurisprudencial de que o uso de “laranjas” deve levar à queda do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap). As três legendas tiveram candidatas que terminaram as eleições sem um único voto e que teriam apoiado outros postulantes a vereador.

De acordo com os partidos, elas teriam desistido de concorrer, mas não se preocuparam em formalizar a renúncia. Sem entrar no mérito individual de cada caso, no entanto, as Aijes de Campina Grande têm ares de aventura jurídica e afronta à democracia. 

Vejamos: 

Doze partidos elegeram vereadores na cidade este ano. Em 11 deles, a última colocada foi uma mulher. Em todos as mulheres foram maioria entre os 5 nomes menos votados.

No Pros, SD e DEM, estas últimas colocadas zeraram, é verdade. Mas, em outros partidos, mulheres foram as últimas colocadas com 03 votos, 11 votos, 12 votos, 14 votos... Ou seja, a diferença é irrelevante. Não há como sustentar uma tese de que uma candidata foi “laranja” por ter desistido e, assim, zerado, e outra, com 03 votos, 11 ou 12, teria sido uma candidata legítima.

Juntos, Pros, DEM e SD somam mais de 40 mil votos. Imagine só cassar os votos de mais de 40 mil eleitores com fundamento em uma tese que distingue por 03 votos a legitimidade de candidaturas!

AFRONTA A PRINCÍPIOS

Anular votos é sempre uma decisão extrema, cabível apenas em circunstâncias igualmente extremas, sobretudo quando não houve qualquer irregularidade no processo de conquista desses votos, sendo o questionamento meramente formal e, no caso em discussão, em um cenário tão frágil.

Mesmo que alguma irregularidade fosse encontrada e confirmada (o que demanda o devido processo legal), os números apontados já deixam claro que simplesmente anular os milhares de votos legítimos de cidadãos atribuídos aos três partidos seria ferir de morte princípios elementares e fundamentais, como a soberania popular. 

Ou como o da proporcionalidade e razoabilidade, por aplicar uma pena extremamente drástica, irrazoável e desproporcional. Estamos falando de princípios fundamentais.

Aliás, atender ao que propõe os não eleitos, nesse caso, representaria uma sanção que, ao invés de atingir o partido (que, eventualmente, tenha cometido uma irregularidade), puniria violentamente os eleitos e, pior, os eleitores – ambos sem culpa nenhuma para uma sanção tão severa e extrema.

O direito de demandar à Justiça é sagrado e legítimo. Mas, na prática, a pretensão é descabida e seu atendimento seria um atentado à democracia.

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