Pi, pi, pi, pi, pi...


Artista de genialidade inquestionável, Roberto Gómez Bolaños, que faleceu nesta sexta-feira, 28, deste aziago 2014, tem em sua biografia as contradições que marcam, em graus distintos, a existência de todo ser humano. Salta, por exemplo, das querelas com outros atores cujo uso dos personagens por ele criados – Chiquinha e Quico, sobretudo – tentou impedir, o ranço da mesquinhez que, no fundo, todos possuímos.

Todavia, para além das misérias humanas, Bolaños imortalizou-se no personagem que se fez maior que o autor, a criatura que sobrepujou o criador. Morreu o gênio, mas sua obra-prima, o irrequieto e apaixonante Chaves, é eterno. O autor e ator, por sinal, há muito deixou o palco, sem que essa distância abalasse a dimensão mítica da figura que construiu.

Enquanto Bolaños envelhecia, enquanto a face tornava-se flácida e disforme pelos anos e pelos problemas de saúde, “o Chaves do 8” permanecia um menino, dando saltos e tomando tombos, ágil, vigoroso e cativante. Permaneceu um menino, insujeito à ação do tempo, determinado a assim estar enquanto suas peripécias e carisma continuarem a prender gente de todas as idades em frente à TV, revendo pela enésima vez o mesmo episódio.

Disse alguém que o humor perdeu uma das suas grandes estrelas. Tremendo equívoco. Não é a graça singela e o estilo pastelão que alimentam esse impressionante fenômeno chamado Chaves. Há algo mais. Há uma graça, uma ligação sentimental, um vínculo afetuoso entre o “menino” do cortiço sem nome e seu público. Aliás, a criação do mexicano, além de rir, muitas vezes nos fez chorar. Meninos e meninas cresceram vendo o Chaves. Estes, hoje, são adultos, mas o Chaves continua o mesmo menino.

E é moleque traquino: arrebatou o coração de mais de uma geração! O humano e gênio Roberto Gómez Bolaños se foi. Chaves, porém, continua vivinho dentro daquele barril. Para nos fazer rir, um riso carregado de carinho. E nos fazer chorar, um choro carregado de nostalgia. Hoje, choramos como ele: “Pi, pi, pi, pi, pi...” Pena que você já se foi, Roberto. Foi sem querer, querendo.

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