Reportagem*: Após "racha" de 1998, tese de reaproximação entre PMDB e PSDB é cíclica

Fundado em julho de 1988, o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) foi criado a partir de uma dissidência do PMDB. Logo, tucanos e peemedebistas são praticamente irmãos de sangue, a despeito da rivalidade que os separa em vários estados do Brasil e mesmo no atual plano nacional, onde o PMDB, aliado de todos os últimos governos do país, compõe a bancada da presidente Dilma Rousseff.

Na Paraíba, apesar de ser um núcleo dissidente, o PSDB passou seus primeiros anos orbitando em torno do então praticamente imbatível PMDB. O rompimento só aconteceria em 1998, quase dez anos depois da fundação do PSDB, quando um grupo saído do PMDB, sob a liderança do então senador Ronaldo Cunha Lima e seu filho, o então prefeito de Campina Grande, Cássio Cunha Lima, após uma derrota nas prévias da legenda para José Maranhão, resolveu criar asas, migrando para o ninho tucano.

De lá para cá, as duas siglas polarizaram a disputa política na Paraíba, alternando-se no comando do poder estadual e protagonizando campanhas acirradas. Tucanos e peemedebistas, mais do que adversários, não raro se portam como inimigos.

Mesmo assim, teses de reaproximação entre os dois partidos vêm e vão. Em 2010, depois de ter sua candidatura a governador abortada pelos correligionários, o senador Cícero Lucena, presidente estadual do PSDB, passou a apoiar o peemedebista José Maranhão na disputa pelo Governo do Estado. Consigo, Cícero levou algumas dezenas de comandados, muito mais interessados no favoritismo estratosférico de Maranhão naquele momento que por qualquer gesto de solidariedade ao presidente.

Passada a eleição, após o favoritismo do ex-governador se desmanchar nas urnas, a tese da reaproximação entre os “irmãos” de PSDB e PMDB reapareceu. Um dos principais arautos da paz tem sido o deputado estadual Trócolli Júnior. Com a premissa de que “em política, tudo é possível”, o peemedebista defende uma composição entre os dois grupos já para as eleições de 2012, e acredita até na possibilidade de conseguir juntar, num mesmo palanque, figuras como José Maranhão, Cássio Cunha Lima, Veneziano Vital do Rêgo e Ricardo Coutinho.

A teoria do deputado, aparentemente infundada, talvez beirando o disparate, pareceu ganhar tônus quando Cássio e Veneziano, num encontro em Campina Grande no mês de março (de 2011), posaram sorridentes e amistosos para a imprensa, brindando com taças de suco e água mineral. Na ocasião, tendo em vista a nítida falta de um candidato de peso no grupo do prefeito, chegou-se a especular a possibilidade de Veneziano apoiar o filho do ex-governador, Diogo Cunha Lima, como candidato a prefeito.

Ao fim do encontro, Cássio e Veneziano trataram de desmentir qualquer possibilidade de parceria política e, nas últimas semanas, a relação entre os dois voltou ao velho azedume. O ex-governador criticou a gestão municipal, e o prefeito disse que o tucano sofre de “ociosidade mental”.

Apesar da pouca duração do clima “paz e amor” e do recrudescimento da guerra entre tucanos e peemedebistas, o vereador campinense Inácio Falcão (PSDB) voltou a defender que uma reaproximação é, de fato, possível. Falcão, que em 2010 votou em Cássio e Vitalzinho para o Senado, garante ser oposição ao prefeito na Câmara Municipal, mas, se o é, faz uma oposição suave, e advoga a união entre os dois partidos. Para o vereador, “em política, é possível até boi voar”, logo, não há porque julgar impossível uma reaproximação.

Até parece que o parlamentar campinense combinou a fala com o vereador pessoense Fernando Milanez, que, na condição de peemedebista, também enxerga viabilidade numa parceria entre os dois blocos. Para Milanez, há até mesmo certa afinidade entre Cássio e Maranhão e, segundo acredita, a composição dos palanques em 2010, com uma até então improvável união do PSDB (ou pelo menos uma parte da sigla) com o PSB, é prova de que, em política, “o boi já voou há muito tempo” – palavras de Milanez.

Há 10 anos, "acordão" tentou reunir adversários

Essa história de PSDB e PMDB juntos outra vez, porém, não é de hoje. Há dez anos, durante a fase de pré-campanha para as eleições gerais de 2002, quando José Maranhão governava o estado e Cássio, então prefeito de Campina, despontava nas pesquisas como favorito absoluto para conquistar o Palácio da Redenção, um grupo teria não apenas apregoado a formação de uma coalizão entre os dois grupos, mas até mesmo trabalhado para colocar em prática o projeto.

O publicitário gaúcho Stalimir Vieira, que atuou na campanha do PMDB, revela em seu livro “O moído de 2002 – Bastidores da campanha eleitoral que rachou a Paraíba” que o então senador Ney Suassuna (à época no PMDB) teria sido um dos pregoeiros da unidade. Ele teria buscado, inclusive, o apoio do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, que, sendo tucano, tinha o PMDB na sua base, e inclusive viria a nomear o próprio Ney para ministro da Integração.

Na página 29 de seu livro, Stalimir Vieira relembra detalhes do chamado “acordão” que, quando chegou a ser ventilado, já trazia até a definição da ocupação de espaços nas chapas. “Em 2001 (...), o cacife de Cícero Lucena ainda era alto. A proposta de um acordo – apelidado de acordão – no decorrer da pré-campanha entre maranhistas e ronaldistas sugeria o nome de Cícero como candidato ao governo e de José Maranhão e Cássio Cunha Lima ao senado”, registrou o publicitário, que garante: o “acórdão” quase foi fechado.

“Ambos os lados negaram a autoria da proposta, ao mesmo tempo em que rejeitavam, com veemência, qualquer negociação nesse sentido. Mas, a verdade é que o acordo foi sondado e andou perto de se consolidar”, afirma. Na mesma página, Stalimir faz elucubrações sobre o que teria dado errado na construção do acordo.

“Provavelmente, a presunção de vitória fácil de Cássio fez com que ronaldistas refutassem o acerto prévio; da parte de maranhistas, a presença de ‘dois deles’ (Cícero e Cássio, grifo nosso) e de ‘um nosso’ (Maranhão) no pacote seria causa de desencanto com o acordão. Aventou-se, na época, que teria sido oferecida a Maranhão, como compensação pelo equilíbrio numérico, a possibilidade de seu sobrinho, Benjamin, ser o candidato a vice-governador”.

A escolha de Ney Suassuna para ministro da Integração Nacional, quando as negociações para o acordo começavam a esmorecer, é vista pelo publicitário como mais um passo na tentativa de reaproximar PMDB e PSDB, passo este que teria contado com a “forcinha” do então presidente Fernando Henrique Cardoso.

“Especulava-se, ainda, a cerca de outra intenção disfarçada na nomeação de Ney: a ressurreição do acordão, a tentativa de juntar maranhistas e ronaldistas numa mesma chapa. Havia um facilitador para essa história: o próprio Ney Suassuna que, pragmático, parecia disposto a aceitar qualquer coisa que evitasse desgastes políticos e econômicos”, conta Stalimir.

Para o publicitário, Ney teria sido o principal articulador do fracassado acordo que, agora em 2011, dez anos depois, mais uma vez dá sinais de que não vai decolar. Em política, é mesmo possível boi voar, mas, nos esforços para tornar a unir PSDB e PMDB, até hoje, a vaca sempre foi pro brejo.

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* Reportagem nossa publicada no Diário da Borborema em julho de 2011

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