1955: ELPÍDIO SE REAPROXIMA DE ARGEMIRO E VOLTA À PREFEITURA. 1959: CABRAL TENTA OUTRA VEZ E SE ELEGE VENCENDO RIQUE

Panfleto de Elpídio e Severino Cruz em 1955

A Paraíba sofreria um duro abalo em julho de 1953, que acabaria provocando a derrocada da poderosa Coligação Democrática, bloco que impôs três duras derrotas consecutivas ao chefe da UDN, Argemiro de Figueiredo. No dia 13 daquele mesmo, um funcionário da prefeitura, João Alves de Brito, conhecido como João Madeira e tido como capanga do então prefeito Plínio Lemos, feriu à bala o vereador Félix Araújo, que investigava as contas do executivo, sobre as quais pesavam suspeitas de irregularidades.

Quatorze dias depois do atentado, Félix morreu, e Plínio Lemos, embora nunca tenha sido provada a sua participação, passou a ser tratado como o mandante daquele crime que enlutou o estado. Félix fora um dos principais personagens da vitória de Plínio, assim como o foi o ex-prefeito Elpídio de Almeida, este o principal responsável pela escolha de Plínio Lemos para a sua sucessão e cujo prestígio de governo foi essencial para a vitória sobre Argemiro. As suspeitas que recaiam sobre o prefeito, repercutidas pelos jornais, tornaram impossível a convivência entre Elpídio e o antigo aliado.

Segundo o historiador Josué Sylvestre, o ex-prefeito, à época deputado federal, sentia-se de certa forma culpado pela morte de Félix, por ter sido o maior responsável pela eleição de Plínio Lemos. Por isso, julgava-se no dever de derrotar pessoalmente, no pleito de 1955, o candidato apoiado pelo ex-aliado. Diante da divisão da Coligação a partir de 1953, correligionários e amigos em comum trataram de costurar a reaproximação entre Elpídio e seu amigo de outrora, Argemiro de Figueiredo.

As negociações vingaram e, esquecendo as rusgas fomentadas desde 1947, os dois líderes políticos firmaram a paz e caminharam unidos para as eleições de 1954, quando Argemiro se elegeria senador, e de 1955, com Elpídio como candidato. Próceres da UDN e parentes tentaram desfazer os planos de Argemiro, propondo a candidatura do ex-deputado Ascendino Moura, mas o “chefe” manteve-se irredutível, o que gerou novo racha na sua base.

De acordo com Josué Sylvestre, até João Figueiredo, irmão de Argemiro, e Veneziano Vital do Rêgo, seu cunhado, dele se afastaram e passaram a apoiar o candidato adversário. O curioso é que em 1947 Argemiro havia provocado a divisão da sua base justamente por manter-se resoluto em torno do nome de Veneziano.

Os dissidentes foram apoiar o candidato de Plínio, Severino Bezerra de Cabral, deputado estadual, então com 58 anos. Abalada pela perda de Elpídio e morte de Félix, a Coligação resolveu desdenhar da saída do ex-prefeito, seu principal quadro na cidade, e cuidou de desvincular o assassinato do jovem tribuno de qualquer responsabilidade de Plínio Lemos. Na estratégia de campanha, o grupo de Cabral também fez largo uso das acusações trocadas por Elpídio e Argemiro durante as disputas de campanhas anteriores, a fim de desmoralizar aquela aliança.

“Tinha como lema o senhor Elpídio dizer em todos os comícios e boletins que o senhor Argemiro tinha adquirido por meios ilícitos grandes fazendas e gado de pura raça. O senhor Elpídio de Almeida, esquecendo onde tinha deixado a dignidade, foi se aliar ao seu maior adversário. Por muitas vezes fez protestos públicos dizendo que nunca se aliaria ao seu maior adversário e do povo, o senhor Argemiro de Figueiredo. Onde está a palavra desse politiqueiro tão sem cerimônia?”, questionava um panfleto (ou “foguete”, como se dizia então) intitulado “Porque!..”, com data de 23/09/1955.

A UDN devolveria na mesma moeda, mas, atacando pesadamente os dissidentes, sobretudo o cunhado de Argemiro, Veneziano, já então deputado estadual no vizinho estado de Pernambuco. Em um panfleto intitulado “Contra os desordeiros”, o candidato tão defendido pelo senador em 1947 é tratado, dentre outros termos, como “especialista em provocações e desordens”, além de “elemento desprezível da nossa sociedade”.

No clima de guerra que sempre marcou as eleições em Campina Grande, mais da metade dos eleitores aptos a votar acabou não indo às urnas naquele 03 de outubro de 1955, conforme os dados históricos do Tribunal Regional Eleitoral. A abstenção foi de quase 54%. E os que foram, em sua maioria, deram a vitória a Elpídio de Almeida, com 13.481 votos (53,91%), contra 11.527 (46,09%) de Severino Cabral. Na disputa para vice-prefeito, venceu o companheiro de chapa do prefeito eleito, o Doutor Severino Cruz, com 13.456 votos, enquanto Bonald Filho somou 11.390.


Após a derrota de 55, o “Pé de Chumbo” vence em 1959

O deputado estadual Severino Cabral não se deixou abalar pela derrota de 1955, e cuidou de preparar terreno para 1959. Argemiro de Figueiredo, já no PTB, convenceu o empresário e banqueiro Newton Rique a ser candidato a prefeito. Naquele ano, estava no auge o Movimento Nacionalista Brasileiro, cuja bandeira na Paraíba era empunhada principalmente pelos jovens, caso do historiador Josué Sylvestre. O MNB queria indicar o bancário Lúcio Rabelo para vice na chapa de Rique, mas a composição foi vetada por Elpídio de Almeida, que indicou para o posto o médico Bonald Filho – que, curiosamente, fora o vice de Cabral em 55, logo, adversário de Elpídio.

Com isso, a duras pedras o MNB compôs uma aliança com Severino Cabral, que assumira o comando do PSD. O deputado também teria relutado em aceitar aquela formação, tendo sido convencido pelo “major” Veneziano Vital do Rêgo.

De acordo com os registros de Josué Sylvestre, que participaria ativamente daquela campanha como membro do MNB, o pleito de 1955 traria duas novidades. A primeira era a presença de um marketeiro político (termo que, à época, evidentemente, não era utilizado) de nome Jorge Albano. Ele veio de Pernambuco, inicialmente para trabalhar para Newton Rique, mas foi vetado por parentes e aliados, que julgavam aquele um gasto desnecessário, e acabou sendo contratado por aliados de Cabral. Em um comício de Rique, o jovem deputado estadual Raymundo Asfora chamou o adversário Severino Cabral de “o pé de chumbo”, uma expressão que indicava o candidato como representante do atraso, da arrogância, da violência coronelista que a tudo destruía.

Albano, que estaria acompanhando o comício, resolveu aproveitar o apodo, dando, no entanto, uma conotação positiva: Severino Cabral era o “Pé de Chumbo” por ser trabalhador, forte, de ações vigorosas e enérgicas. Assim, o “apelido” se tornaria marca da campanha do candidato do PSD e, mais que isso, a figura se atrelaria à sua imagem para sempre.

Uma outra novidade de 59 foram as cartas-programa, ideia introduzida por Newton Rique e que, diante do seu sucesso, acabou também sendo usada pelo adversário. O programa de governo de Rique foi batizado de “Revolução da Prosperidade”, e, para alguns, ainda hoje seria um conjunto de projetos atualizados. A carta de Cabral foi denominada “Revolução de Polichinelo”.

A campanha seria mais uma vez acirrada, com pesadas trocas de acusações e pródiga nas armações e factóides que marcam a disputa eleitoral na cidade (na verdade, no estado). Às vésperas da eleição, ocorreria um fato surpreendente, a chamada “operação fura-pneus”. Conforme Josué, sendo prática comum da época aliados dos candidatos conduzirem eleitores às seções eleitorais, rara ocasião em que a gente mais simples tinha o luxo de andar de carro, assessores do “Pé de Chumbo” teriam, durante a madrugada, furado os pneus de veículos de aliados e amigos de Newton Rique, que, pela manhã, perplexos, fariam fila às portas das borracharias.

A votação ocorreu no dia 02 de agosto daquele ano de 1959, e Severino Cabral venceu: 16.483 sufrágios (52,75%), contra 14.767 (47,25%) de Rique. A abstenção foi de quase 20%. Já a eleição para vice teria um resultado inesperado e polêmico: a vitória de Bonald Filho, por uma diferença de apenas 59 votos. Segundo o relato de Josué Sylvestre em seu livro “Nacionalismo e Coronelismo”, jovens do MNB montaram guarda à porta do Tribunal Regional Eleitoral, como fiscais, para evitar as famosas e temidas fraudes.

Na noite que antecedeu a conclusão da apuração, todavia, faltavam apenas cerca de dez urnas, e Lúcio Rabelo estaria com uma confortável vantagem de aproximadamente 300 votos. Com isso, os rapazes resolveram afrouxar a vigilância e comemorar antecipadamente. Josué é enfático: “Que houve fraude, é quase fora de dúvida”. E mais: “Semanas depois, um juiz diria a Lúcio: ‘Você não pode revelar publicamente, porque não é possível provar, mas você ganhou a eleição”. O historiador, que vivenciou aquela fase, isenta totalmente o vice eleito, Bonald Filho, de “qualquer participação na possível fraude”.

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Matéria nossa publicada no Diário da Borborema de 25 de setembro para a série "Eleições Municipais"
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