ENTREVISTA - COZETE BARBOSA: “A HISTÓRIA VAI ME FAZER JUSTIÇA; A HISTÓRIA VAI ME DAR RAZÃO”

Cozete Barbosa teve um início de carreira brilhante mesmo nas derrotas, como em 1998 quando, sem grandes recursos, ficou em terceiro lugar na eleição para o Senado, com quase 20% dos votos – vencendo em Campina. Veemente em seus discursos e ações, infernizou a vida de adversários, sobretudo de Cássio Cunha Lima. Até que, em 2000, numa das provas de que nada é impossível na política, os dois acabaram se aliando. Em abril de 2002, Cássio se afasta para disputar e vencer a eleição para governador e Cozete torna-se a primeira mulher a assumir prefeitura de Campina Grande. Seria o auge de uma carreira brilhante. Seria o fim de uma carreira brilhante. Deixaria a prefeitura após não se reeleger, passando a enfrentar dezenas de denúncias de irregularidades na sua gestão, e acabou expulsa do PT. Em uma entrevista exclusiva ao colunista Lenildo Ferreira, a ex-prefeita faz revelações sobre todas essas fases, diz que vai dedicar a vida a limpar seu nome e deixa no ar a dúvida sobre uma possível volta às disputas eleitorais.

Desde 01 de janeiro de 2005, quando deixou a prefeitura, a senhora está fora das disputas eleitorais. Sente o desejo de voltar?

Nunca deixei de fazer militância, independente de estar em partido. Antes de qualquer coisa – vereadora, prefeita – sou uma militante. Sobre voltar a me candidatar, isso não está definido na minha cabeça. As pessoas me cobram isso. Tenho em Campina uma história política de mais de trinta anos, uma militância e um trabalho social muito grandes. Mas, disputar eleição não está claro para mim, até porque passei por um processo muito dolorido. Tenho que colar todos os meus caquinhos, me reorganizar, reorganizar as minhas emoções, curar as minhas feridas para que eu possa oferecer o que tenho de melhor. Agora, é uma possibilidade, afinal, a política está no meu sangue.

A senhora pensa em voltar para o PT?

Em tudo o que eu passei, apesar de todo o sofrimento inigualável, acredito que há uma coisa boa, que é o amadurecimento político. Não dá para guardar ódio ou mágoa. O PT está acima de muitas coisas. A conjuntura do partido que enfrentei era dificílima, a direção estadual não compreendeu aquilo e acho que fui um bode expiatório naquele momento. Não me vejo em outro partido, mas também não quero criar problema para o PT. Vamos conversar com o partido; se for o momento, se houver um consenso, se for pra somar, tudo bem. Se eu voltar, será para ser uma militante, não para gerar conflitos.

O que a senhora pensa de Rodrigo Soares, presidente estadual do PT?

Rodrigo é um grande quadro do partido. Eu não queria estar no lugar dele, porque ser presidente do PT é quase um carma. Fui presidente do partido em Campina três vezes e o PT tem uma cultura de muito conflito. Às vezes é um para construir e outros brigando para desconstruir. Mas, acho que Rodrigo vai conseguir aglutinar o PT.

Como a senhora avalia, hoje, seu desempenho à frente da prefeitura?

Foi uma conjuntura muito difícil, com verbas muito pequenas. Logo após deixar a prefeitura, Cássio Cunha Lima bateu no meu ombro e disse: “A prefeitura está falida”. Todos torciam para que eu fechasse a prefeitura, e isso não aconteceu. Nós deixamos nove bairros sem analfabetismo adulto feminino; quase duplicamos o número de alunos nas escolas; fizemos 200 cisternas de placa; tínhamos 0% de PSF na zona rural e deixamos com 100%. Encontramos a prefeitura sem um único medicamento. Tive que dar um cheque meu para comprarmos medicamento. Reabrimos o hospital de Galante, reformamos o Isea e o Francisco Pinto; deixamos dinheiro em caixa para construção do Restaurante Popular; construímos uma escola por ano, creches modelos nos bairros mais carentes, como o Mutirão e o Jardim Continental. Enfim, eu repito o que Fidel Castro disse: “A história vai me fazer justiça; a história vai me dar razão”.

A senhora entrou na eleição de 2004 acreditando que conseguiria vencer?

Eu não queria a reeleição. Tentei conversar com os aliados e não consegui dialogar isso. Fui para a reeleição muito mais para servir ao partido, como havia ido para uma aliança com Cássio para servir ao partido. Não queria disputar a reeleição, porque tinha um cenário muito desfavorável: não tinha recursos, não tinha um nível de alianças razoável. Havia uma rejeição muito forte das elites e da classe média contra mim. As pessoas não me conheciam – e continuam não me conhecendo. Pensam que eu vim da classe C ou D, o que não é verdade. Eu vim da classe média alta, meu pai era industrial, estudei nos melhores colégios... E fiz uma opção de entrar na luta pelos mais pobres. Mas, as pessoas diziam: “Cozete veio da classe C ou D, se elege prefeita e agora se acha a ‘bam bam bam’”. E pessoas das classes C e D diziam: “Essa menina vivia ocupando casa, terra e agora é prefeita”. Isso gerava uma rejeição. Essa história nunca foi bem contada.

Em que pé andam seus processos? Quantos são, na verdade?

Mais de oitenta. Fui absolvida na maioria. No caso dos vales, que chegaram a dizer que havia um mensalão na prefeitura, foi o próprio promotor que pediu minha absolvição. Fui absolvida no caso dos cheques sem fundo. Aliás, nunca passei um cheque da prefeitura, porque pela Lei Orgânica do Município quem é responsável pelas contas é a secretária de Finanças e o tesoureiro. Nunca desviei dinheiro da prefeitura, nunca se encontrou um centavo desse dinheiro em conta minha. Não tenho um único imóvel, não tenho carro. Estou à disposição da justiça, presto meus depoimentos, nunca fiz nenhuma manobra para correr desses processos. Os processos em que fui condenada, é porque não houve defesa, correram à revelia, e agora estou recorrendo. Enquanto vida eu tiver, o que quero é limpar meu nome. Não apenas na justiça, mas perante a opinião pública.

Como a senhora avalia essa quantidade tão elevada de processos?

Nada consistente. Denúncias, calúnias sem provas, sem gravação, sem papel, sem assinatura minha. Houve um desrespeito ao meu pai, aos meus filhos, pessoas inocentes. Meus filhos e meu pai nunca se meteram em nenhuma transação da prefeitura. Uma coisa absurda. Denunciam que tenho dinheiro, mas onde está esse dinheiro? O pessoal diz que não deixo morrer esse assunto, mas não quero deixar morrer. Quem tem culpa é que quer que morra o assunto. Enfim, fiquei muito só nesse processo. Aliás, quero agradecer de público ao doutor Bruno Veloso (advogado), que me ajudou e muito. Quando pude pagar, paguei, mas quando não pude pagar – e foi na maioria das vezes – ele me defendeu.

Em 2009, circulou a informação de que a senhora havia tentado suicídio. Isso aconteceu?

Na realidade, tive um choque, com uma série de notícias ruins (além das questões na justiça, a morte de dois sobrinhos), e isso causou um processo de amnésia. Nessa fase, é difícil dizer o que aconteceu. Sei que fui internada e as pessoas dizem que houve uma tentativa, por meio de comprimidos. Mas, não foi uma coisa consciente.

Um dos pontos mais contestados da sua carreira é a aliança com Cássio Cunha Lima. A senhora se arrepende dessa aliança? Foi um acordo puramente pragmático, para que a senhora chegasse ao poder?

Eu era muito ingênua, e acho que o PT local também. O que havia na época era uma necessidade de eleger Lula, que estava na quarta campanha presidencial, e era preciso se quebrar, nos estados, essa história de que o PT não fazia alianças. A aliança com o PMDB (então partido de Cássio) foi, inclusive, aprovada pelo diretório nacional. Às vezes, as pessoas dizem que Cozete fez a aliança porque queria. Mas, esse acordo foi votado pela base do partido em Campina Grande, pelo diretório estadual e, depois, pelo diretório nacional. É óbvio que eu aceitei, mas essa aliança foi feita pelo PT. Não posso me arrepender porque me deu experiência e eu não posso mudar o passado. Com a experiência que tenho hoje, se eu pudesse voltar ao passado, obviamente não aceitaria essa aliança. Hoje sei que caí numa armadilha, que todas as negociações que foram feitas, acabaram quebradas. A política é um campo minado. Só que não gosto de me colocar no papel de vítima. Fomos ingênuos, acreditamos num Cássio progressista, que superava divergências, um Cássio que não existia.

A política destruiu sua vida?

Acho que não a política, mas uma certa forma de fazer política, um certo tipo de exercer o poder. Ainda acredito que haja política decente, políticos dignos. Não quero me fazer de vítima.

A senhora está escrevendo um livro. Como podemos classificá-lo? É um livro-bomba?

(Risos) É um problema, porque não sei se quero que o livro seja pessoal. Não quero que seja vingativo. Tenho muita história para contar, tenho muito documento, muita foto, assuntos sobre os bastidores da política. Espero terminá-lo até dezembro, mas a solidão de escrever é horrível. Não quero que seja um livro pesado. Mas, tem algumas coisas que quero escrever que só quando eu morrer é que vão querer publicar (Risos).

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