OPINIÃO: ENTRE TAPAS E BEIJOS

Ontem, dia do jornalista, a categoria recebeu inúmeras homenagens da parte de políticos, estes sempre ciosos em registrar qualquer data comemorativa. Uma das considerações mais curiosas foi feita pelo jovem deputado estadual Caio Roberto, do PR. “Não existiria luz se não fosse a escuridão; alegria, se não pela tristeza; e políticos, se não fossem os jornalistas... Parabéns pelo seu dia!”, escreveu Caio em seu Twitter.

As palavras do deputado são tanto quanto misteriosas, como o sorriso da Monalisa. Teria sido isso uma homenagem? Dois pontos, em particular, deixam essa dúvida. Primeiro, Caio contrapõe o lado positivo das coisas – luz, alegria – ao aspecto negativo – escuridão, tristeza –, e, no fim, coloca os jornalistas ao lado desta última. Ademais, diz que não existiriam políticos, não fossem os jornalistas. Um leitor mais desatento pode entender essa tese como uma acusação aos militantes da notícia: jornalistas inventaram políticos. Um advogado, por favor! Senhor, livrai-nos desse cálice!

Ironias à parte, a verdade é que a relação intrínseca entre as duas classes é inegável. Ocorre que o político é notícia, e a notícia é o objeto de trabalho do jornalista. Este age como olhos, ouvidos e boca da sociedade. Cumpre o papel de acompanhar os fatos, negativos ou positivos, e torná-los públicos, porque a coisa pública precisa ser totalmente transparente – e não é.

Nesse ponto, a relação azeda. Em geral, a formação psicológica dos políticos, sobretudo nestas terras paraibanas, revela-se duramente infensa a quaisquer notícias que não sejam palavreado laudatório. A crítica, qualquer que seja, é recebida como ofensa, um ataque ao poder e, como tal, deve ser (pensam) neutralizada. E dessa mentalidade surgem as distorções. Fazer jornalismo sério é um desafio diário. Jornalismo político, mais ainda.

Quanto mais independente é a imprensa, mais madura a democracia. Enquanto nossa democracia não amadurece, jornalistas e políticos seguem suas estradas conforme a letra da canção: entre tapas e beijos.

Publicado no Diário da Borborema desta sexta

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