É SEMPRE CARNAVAL

E cá estamos a enfrentar mais um carnaval. Não se pensa e não se fala em outra coisa. Momo, intrometido, faz parar o ano que, em pleno mês de março, mal começou. Não importam nossos desafios, nossos problemas, nossas contradições. Não se fala mais no aumento escandaloso dos salários de deputados e senadores, na verdadeira PEC 300 que empacou no Congresso, na gente que morreu soterrada no Rio de Janeiro, na alta sufocante dos juros, na tesoura faminta da presidente Dilma Rousseff.

É tempo de festa, de folia, de enlouquecer nas ladeiras de Olinda, de varar a madrugada atrás do Galo, de se perder na Sapucaí, de requebrar no Pelourinho, de virar muriçoca no Miramar. É tempo de fantasia, de colorir a vida monocrômica com purpurina, de fingir que, por conta própria, aquilo que não é como deveria ser será como se quer que seja. Tempo de esquecer que, por aqui, é sempre carnaval, há sempre fantasia, a farra nunca cessa.

Por esta grande avenida chamada Brasil já desfilaram, ao longo das últimas décadas (e seguem desfilando, que a farra não para), escolas campeãs, como os “Unidos do Dólar na cueca”, “Acadêmicos do Mensalão”, “Estação primeira da roubalheira”, “Mamãe, eu quero mamar no Congresso” e “Felizardos da Impunidade”. Enquanto isso, no carnaval sem fim das ruas, vê-se blocos de esfarrapados como “A gente morre no SUS”, “Me dá uma esmola aí”, “O ensino não ensina” e “Pra que dá o salário mínimo?” – este último, escandaloso, com gente “coberta” apenas por sumários tapa-sexos, o máximo permitido pelo mínimo.

A nudez, todavia, não choca mais, porque o enredo diário deste reino tupiniquim é de vergonha que, de tanto repetida, vai deixando de ser sentida, vai virando sem vergonha. Entretanto, a figura mais popular da eterna folia desse país, o que mais se vê durante todo o ano, são aqueles personagens sem nome, sem cara, sem importância nenhuma, costumeiramente chamados papangus – e também conhecidos como povo. Viva o carnaval! Samba, Brasil! Samba que a gente dança.

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